TRANSE
A Fenomenologia do Transe
Tão velho quanto o ser humano-
Estados de transe e possessão formam parte
do quadro religioso de quase todas as civilizações existentes.
A raridade das manifestações psico-fisiológicas que acompanham
o transe serve de base para todo tipo de interpretações, geralmente
relacionadas com causas sobrenaturais ou misteriosas.
Muitos povos primitivos da atualidade
usam o transe na sua experiência religiosa; é de se supor
portanto que este tipo de alteração da consciência venha sendo
provocado pelo ser humano desde os primórdios de sua história.
Os chineses do séc XVIII a/C praticavam o culto
aos antepassados. Para entrarem em comunicação com os parentes
desconhecidos submetiam-se a um ritual acompanhado de músicas
e danças giratórias que conduziam a um frenesí coletivo de
convulsões, saltos, e corridas desenfreadas, até que conseguissem
cair no transe como meio de participação com o mundo dos mortos.
Nos santuários de adivinhaçào da grécia antiga, adolescentes
do sexo feminino, as pitonisas, eram escolhidas para serem
possuídas por Apolo. Os momentos de transe representavam a
descida de deus. Para os "aissauis" do Islã , o transe lhes
propiciaria estados de insensibilidade à dor e para alcançá-los
recorrem ao djedjeb, movimento violento que se imprime à cabeça
de esquerda à direita enquanto os braços permanecem pendentes
e as pernas marcam o rítmo.
Na atualidade, o transe faz parte da prática
religiosa de milhões de pessoas. Para o espiritismo, é condiçào
necessária para possibilitar a comunicação com os espíritos
dos mortos; o médium, em transe, emprestaria seu corpo para
que um espírito o usasse como veículo de manifestação aos
vivos. De maneira semelhante , os cultos afro-americanos (vudú,
macumba, umbanda, camdomblé, etc) veem nele o caminho mais
fácil para atrair as divindades e outras entidades sobrenaturais
(orixás, exús, pretos-velhos...) até os terreiros de celebração.
Nestes casos , o médium serve de "cavalo" à entidade incorporada.
Os cristãos de todas as igrejas interpretaram
frequentemente estes estados alterados de consciência como
uma prova da graça de Deus ou como um sinal de possessão por
parte de algum espírito imundo. Hoje em dia são muito comuns
os cultos ao Espírito Santo; neles os participantes , após
uma série de práticas carregadas de forte emotividade, chegam
ao estado de êxtase religioso, manifestando-se então, por
boca dos fiéis, mensagens do espírito e até o chamado "Dom
de Línguas". Se bem que, as igrejas que tem sua fé estruturada
num alto grau de reflexão teológica encarem o êxtase com muitas
reservas, sendo raríssimos os casos em que os interpretam
como uma reação orgânica perante uma possível manifestação
divina.
Em ambiente profano, a psicologia das multidões
também nos apresenta exemplos frequentes de massas em transe,
empolgadas pelas palavras de um líder político ou pelo som
alucinante de um conjunto de música moderna.
Muitas são interpretações ou justificativas
que os estudiosos dão para o transe. Todas elas naturalmente,
dependem do ponto de vista com que são encaradas e também
das circunstancias em que se manifesta o fenômeno. Para o
antrpólogo, o transe poderia simbolizar a morte da carne em
vistas a renaser a uma vida, uma sensibilidade ou uma vivencia
nova. O sociólogo pode ver nele um meio usado por determinados
grupos para aliviar tensões, fortalecer crenças ou estruturas
sociais. O psicólogo talvez o interprete como um mecanismo
compensatório do individuo (sentir-se alguem, escolhido, agraciado,
em intimidade com o além...) ou como um sintoma de cisão da
personalidade para o psiquiatra. Enfim, o teólogo pouco avisado
poderá interpreta-lo como uma prova da graça divina ou como
um sinal de condenação eterna.
Quando a consciência se ofusca-
O transe pode ser considerado como um estado
hipnóide de dissossiação psicológica que libera, em maior
ou menor grau, o inconsciente do controle total da consciencia.
Este estado de dissossiação se caracteriza pela ausência de
movimentos voluntários e com frequencia pelo automatismo da
atividade ou do pensamento. A etimologia da palavra, transitus,
nos está indicando o sentido de passagem; passar dum estado
de consciência a outro.
Como nos estados hipnóticos profundos,
verificam-se tambem no transe profundo três características
psicológicas:
A sugestionabilidade, a memória alternante (lembranças
do acontecido em estado de transe anteriores e esquecimentos
durante a vigilia e amnésia ao acordar.
Também em ambos os estados costumam
manifestar-se as mesmas caracteristicas fisiologicas: contraçoes
e relaxamentos musculares, perdas de reflexos , etc.
Por esta identidade em transe e hipnose, a psicologia
os considera como um mesmo fenomeno. O Doutor M. E. Pascal
em 1935, fez um estudo exaustivo mostrando a total identificação
psico-fisiológica entre transe, hipnose e êxtase. Sua conclusão
foi esta: o Transe
é pura e simplesmente um estado de sono hipnótico.
Verificada esta identidade, chega-se à conclusão de que não
existem diferentes tipos de transe (hipnótico, mediúnico ,
espírita , metapsiquico ou parapsicológico) do ponto de vista
psico-fisiologico, mas um só: o transe.
"Quando aludimos a fenômenos metapsíquicos podemos
denominar o transe, por conveniência de expressão, estado
metapsíquico ou parapsicológico. De acordo com sua forma de
indução, pode ser o transe auto-provocado (concentração voluntária,
invocação de espíritos, etc.). Em ambos casos, o que presumivelmente
se obtém é um certo grau de dissociação da consciência, acompanhado
de manifestações hipnóticas, ou de tipo de possessão espírita
(personificações) segundo as crenças do sujeito e a forma
de indução.
Em parapsicologia, entendemos por transe o estado
de inconsciência mais ou menos profundo no transcurso do qual
se manifesta ou pode manifestar-se uma atividade parapsicológica.
Diferente do sono, o transe ou sono hipnótico,
mesmo sendo profundo, é algo diferente do sono ordinário.
No sono normal perde-se qualquer vínculo com a realidade exterior
ao sujeito, enquanto que no transe se mantém um vínculo ou
ponto de referência ativo entre o sujeito e o hipnotizador
ou entre o sujeito e as circunstâncias ambientais que propiciaram
o fenômeno.
"Os
psicólogos Wible e Jenness, após minuciosas experiências com
estudos eletrocardiográficos e respiratórios, chegaram à conclusão
de que a ação do coração e dos pulmões durante a hipnose(ou
transe) era mais semelhante ao do estado de Vigília que a
do sono fisiológico natural. Nygard, medindo a circulação
cerebral durante a vigília, a hipnose e o sono, chegou a conclusão
de que a circulação sanguínea durante a hipnose (ou transe)
era mais semelhante a do estado de vigília que a do sono.
Bass descobriu que o reflexo rotuliano diminuia durante o
sono real, mas era quase o mesmo no estado hipnótico e no
de vigília" .
Com métodos de investigação diferentes, o Dr.
Fernando Cazzamalli, na época professor de psiquiatria e neurologia
da Universidade de Roma, chegou a mesma constatação que os
anteriores. Só que suas experiências apontam um fator novo.
Mediu as ondas eletromagnéticas emitidas pelo cérebro em dotados
parapsicológicos em transe, no momento em que manifestavam
suas faculdades: rabdomantes, psicômetras, clarividentes,
adivinhos em geral. Nos estados de repouso cerebral, no sono
p.ex., não captou nenhuma atividade eletromagnética, sendo
que teria estabelecido a existência destas radiações no caso
de dotados em transe. "Sua conclusão é que o estado fisiológico
do cérebro nestes casos, no que diz respeito a emissão dessas
radiações, é comparável aos estados de intensa atividade psíquica,
que se produzem durante as criações artística e literária.
Na Argentina, o Dr. Canavésio, teve o mérito
de ser o primeiro a aplicar o eletroencefalograma nos dotados
parapsicológicos quando os sujeitos manifestavam suas faculdades.
Mesmo estando os sujeitos em estado de transe mais ou menos
profundo no momento das percepções extra sensoriais, o estado
elétrico do cérebro não era o de sono natural, mas o das etapas
que precedem ao sono:
crepuscular ou de semi-consciência.
Esta descoberta reforça a opinião generalizada
de que a manifestação de qualquer fenômeno parapsicológico
requer uma alteração na consciência do sujeito, que provocaria
um estado de inconsciência, maior ou menor, dependendo da
idiossincrasia de cada dotado.
Uma constatação final se torna evidente:
Os registros encefalográficos
modernos são da mesma natureza nos sujeitos em transe, seja
este de tipo hipnótico, mediúnico ou parapsicológico, independentemente
de se o sujeito atribue seu estado à ação de entidades espirituais,
à sugestão direta dum hipnotizador ou à sua capacidade de
autosugestão.
Continua no próximo
número
Texto extráido da
Revista de Parapsicologia número 25 elaborada pelo CLAP- Centro
Latino Americano de Parapsicologia - Por Pablo Garulo
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