Milagre
e curandeirismo
O curandeiro, precisamente por ser curandeiro e charlatão,
a todos diagnostica,a todos receita e a todos diz que "cura".
Os que vão embora sem ação "terapeutica", constituem exceção.
Nos santuários Cristãos, porém, a ninguém se diagnostica,a
ninguém se receita. E o que constitue exceção é a cura milagrosa.
O Milagre não é regra, não é comum, é rara exceção. A finalidade
do milagre não é substituir ou colaborar com a medicina.
Trata-se unicamente de alentar a Fé e confirmar a Doutrina
revelada.
Os que fazem a propaganda dos curandeiros
dizem, sem verificação científica nenhuma, que ocorrem milhares
e milhares de curas, de cada curandeiro.
Em contrapartida, após intermináveis
verificações, a Igreja aprovou, em 100 anos de história
de Lourdes, pouco mais de 60 milagres. Pouco mais de
sessenta curas entre milhões de pessoas que se dirigem a
Lourdes primordialmente para rezar e honrar a Sma . Virgem.
Entre catolicismo e curandeirismo, há notáveis diferenças
nos métodos empregados, por mais que o curandeiro queira,
frequentemente, se disfarçar com aparências de ritos católicos.
Não há dúvida de que uma grande parte do "êxito"
dos curandeiros se deve a que eles influenciam seus "clientes"
rodeando de mistério (sugestionando) as mais singelas práticas
e os remédios mais inoperantes. Ritos emprestados do catolicismo
tem sido associados frequentemente a processos "terapeuticos"
postos em prática por adivinhos-curandeiros... Inclusive
certas superstições difundidas entre os cristãos, como uma
paródia dos sacramentais, tem sido também usadas pelos curandeiros
ou por eles recomendadas, segundo os casos, com maiores
ou menores modificações: unções (bençãos)
em forma de cruz, beber ou lavar-se com água benta, colocar
sobre a parte doente do corpo uma relíquia ou qualquer outro
substitutivo ou amuleto, orações mágicas ou "fortes" receitando-as
aliás, durante um tríduo ou novena, etc.
Desta imitação, por curandeirismos, dos sacramentais
católicos, alguns pretendem identificar o milagre com a
"cura" mágica. Mas, na realidade, essas caricaturas empregadas
pelos curandeiros são muito diferentes do verdadeiro sentido
dos sacramentos e sacramentais.
Os sacramentos são infalíveis pela promessa divina, mas
promessa unicamente da graça espiritual, nada tendo a ver
com a saúde do corpo.
Alguns autores citam o sacramento da extrema-unção (chamado
tb de Unção dos enfermos) como incurso em certo modo no
curandeirismo, e citam o texto de São Tiago .
Isto é um erro. O texto de São Tiago refere-se a algo bem
diferente. O Texto visa principalmente o ambito espiritual,
sobrenatural, religioso, e só em um bem definido segundo
plano, à saúde. "Está doente algum entre vós? Chame aos
presbíteros da Igreja que orem sobre ele e o unjam com óleo
no nome do Senhor. E a oração da fé salvará o doente, e
o Senhor o levantará e lhe serão perdoados os pecados que
tiver cometido" É principalmente
no terreno da salvação religiosa, do perdão dos pecados
e do crescimento espiritual.
Assim o tem entendido teórica e praticamente a Igreja, a
intérprete autorizada, nos seus 20 séculos de história.
Há quem, sectária e inconsideradamente tenha acusado ao
próprio Cristo de curandeirismo. Cristo respeitou todas as leis do seu tempo, mesmo
o injusto tributo aos romanos. Não sabemos
que houvesse então na Judéia, legislação contra o curandeirismo,
mas em todo o caso a atitude
de cristo é bem diferente da dos curandeiros.
Cristo não levou as massas à histeria emocional esperando
a "cura". Ele não excitava a sugestionabilidade, não precisava
da presença do doente, como demonstrou com a cura do filho
de um oficial ou com a filha da Cananéia (Mc VII, 24-30)
Curava mesmo quem não sabia quem Ele era, como no caso do
cego de nascença (Jo IX, 35-38) ou do paralítico da piscina
de Betesda (Jo V, 12-13). E os mortos que Cristo rescussitou
dificilmente poderiam ser sugestionados!
Não houve nenhuma Campanha publicitária de "curas" e nenhum
anúncio de tais demonstrações. Cristo até proibia que os
agraciados publicassem sua cura, porque advertia o perigo
de que os interesses egoístas do povo quisessem desviar
sua Missão para o lado utilitarista da cura e outras vantagens
meramente humanas.
Assim, por exemplo, após ressussitar a menina de
doze anos, filha de Jairo, "ordenou-lhes severamente que
ninguém o soubesse"; (Mc V, 43) após curar um surdo-mudo,
"proibiu-lhes que o dissessem a alguém";(Mc VII, 36) após
curar dois cegos, recomendou-lhes Jesus em tom severo: Vede
que ninguém o saiba", etc. (Mt IX, 30)
Os Milagres que Cristo fazia eram exclusivamente para confirmar
sua Doutrina, para que os homens, "por causa das obras",
cressem Nela como revelada por Deus. Cristo não fez milagres
para substituir ou completar a medicina, como é a pretensão
de todos os curandeiros. É bem esclarecedora sua frase:
"Não são os que estão bem que precisam do médico, mas sim
os doentes".
Há em Jerusalém, perto do pórtico das abelhas, um tanque,
chamado em hebraico "Betesda" e que tem cinco pórticos.
Nestes pórticos jazia um grande número de enfermos, de cegos,
de coxos e de paralíticos, que esperavam o movimento da
água. Pois, segundo se dizia, em tempos, um anjo do Senhor
descia ao tanque e a água se punha em movimento, e o primeiro
que entrasse no tanque, depois da agitação da água, ficaria
curado de qualquer doença que tivesse. Estava ali um homem,
enfermo havia 38 anos. Vendo-o deitado e sabendo que já
havia muito tempo que estava enfermo, perguntou-lhe Jesus:
"Queres ficar curado? O enfermo respondeu-lhe: "Senhor,
não tenho ninguém que me ponha no tanque quando a água é
agitada. Enquanto vem, já alguém desceu antes de mim". Ordenou-lhe
Jesus: Levanta-te, toma o teu leito e anda". No mesmo instante,
aquele homem ficou curado, tomou o seu leito e foi andando".(Jo
V, 2-9)
Nenhuma semelhança com o curandeirismo. Como nos Santuários
Cristãos, uma só pessoa curada basta para confirmar a Doutrina
Revelada e manter a Fé. Cristo não se dirigiu a todos: dentre
aquele "grande número", curou a um único doente. E nada
de diagnósticos, nem de explicações pormenorizadas da doença
e nem excitações de emotividade histérica. Era manifesta
a Fé sobrenatural daquele homem que há 38 anos esperava
lá a intervenção divina e por isso cristo nem sequer lhe
perguntou algo sobre sua fé em Deus; simplesmente deu-lhe
a ordem de caminhar...
Concluindo: Nos tempos antigos como nos tempos modernos,
a "cura" dos curandeiros (sugestão) responde fundamentalmente
aos mesmos truques e às mesmas técnicas: além
de ser anticientífico, é desaconselhável e perigosíssima.
A "cura" sugestionada dos curandeiros
é responsável pela multiplicação de doenças psíquicas e
o ambiente doentio da superstição.
Pretender identificar tal curandeirismo,
com as curas (Milagres) para confirmar a Fé realizadas por
Cristo, pela intercessão dos santos e nos Santuários Católicos
é manifesta miopia e cegueira.
Oscar
G. Quevedo S.J
Revista
de Parapsicologia número 15 elaborada pelo CLAP-